13.10.08

Não sei escrever sobre o amor


Não sei escrever senão sobre o amor, lamechas, confidente, pensado e louco, violento na sua amargura, perfeitamente doce e simétrico nas horas das mãos dadas e das palavras caladas que tudo dizem. Remeto-me ao inconsciente das palavras que procuro e percebo como é mais forte a ausência do amor.
Há uma continuidade no sofrimento do explicável, a sensação do vazio de quem não tem, a angustiante e agonizante revolta do que vemos e não temos, a revolta de não querermos daqueles que nos gostam e de querermos sempre de quem não nos gosta.
O Amor tem um Q maiúsculo agarrado, um Q de querer, de posse, como um alfinete de dama, pronto a não se deixar cair, nem a ventos nem a borrascas. O amor transforma-nos em fidalgos abastados, possuidores.
O nosso amor tem muitas vezes a figura dos rendeiros, que nos enchem e nos alimentam, e ao qual nada mais damos senão o coração para que o cultivem e reguem e façam brotar o trigo e o centeio verde, que logo se faz louro e pão e vida.
Por vezes detesto o Amor, de tão rigoroso e missionário, de tão verdadeiro. Como por vezes seria melhor apenas o sexo, apenas a carcaça que se usa ou se evita, apenas a vontade irresistível de despir e vestir quem por nós passa. O Amor assassina os voláteis e cobra à paixão, anos de escravidão, chama-lhe puta e vaca e não a deixa passar da porta. A paixão dorme no celeiro, com o cheiro das bestas, e o odor das saias de roda ainda quentes que se baixam quando o barulho de quem chega, surpreende e descobre.
O Amor é demasiado sério, é feito de carne e sangue e cheira aos neurónios afogados em entendimento e compreensão, em visões que mais ninguém percebe, em sons que nunca ninguém escutou.
De repente há palavras que passam, que me pressentem e viram os narizes apenas para dizer que passam. Vão para o colóquio no sítio mais fino da cidade das letras, levam com elas os textos sérios e importantes sobre o resto da vida. Comigo, bebendo um copo, acachapados nessas cadeiras de verga, sobre uma mesa de metal velha e enferrujada, ficam os versos lamechas, lavados na sabonária dos instintos, mal pensados, sem dormir, que me enchem esta vida, onde nunca consigo falar de Amor.

5 comentários:

Anónimo disse...

Pois...continuas a escrever sobre o amor como ninguém...e é tão bom reencontrar-te...sem nunca te esquecer.

Vou voltar...agora...mais do que nunca.beijos muitos e doces.
I...

nas asas de um anjo disse...

uuh...até fiquei sem folego ao ler esta descrição, tão boa e intensa, do amor!
sem duvida q, afinal,ate sabes falar do amor mas nunca falamos tudo, há sempre um indizível q o acompanha e q é,provavelmente, aquele q nos fascia, arrepia e (e)ternamente nos seduz neste sentimento...a meu ver, o + poderoso de todos!
ainda bem q escreveste, devias faze-lo+vezes.
bjs

Moon_T disse...

nas letras que transportam todas as falas, nas virgulas que sustentam os sentimentos e os paragrafos que nos rasgam a alma...
pra que falar de amor?

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
nas asas de um anjo disse...

deixei-te um "mimo" lá no blog!(",)