17.7.12

Sol novo

















Andamos pelo mundo como cirandássemos perdidos pelos campos de batalha. Nem lutámos. Apenas estamos, perdidos, de visão turva sobre o campo, outrora verde, hoje rubro. Os corpos são o rescaldo, frios, nem importa, porque nada importa.
Os corpos não têm alma, decepados, enterrados na terra e no sangue, outros de faces lívidas parecendo sonhar. Eu caminho, como um autómato, busco apenas o que quero, busco e nada encontro, e cada rosto, desconhecido, faz-me feliz por não ser quem quero.
Os corpos perpetuam o silêncio das cidades cheias, onde nada conheço, onde nada sou. Os estandartes caídos não erguem exércitos. Paro, reclamo de mim mesmo, sou aquilo que tenho nas mãos vazias, cheirando a terra, enxutas do sangue.
O mundo é um reportório de gentes zangadas, é um desenho a solo de cada par de olhos, uma história antiga de quem cresce e se mantém antigo, na luta pela sobrevida a uma morte anunciada. Somos a geração urbana, dos civis civilizados, dos que se mantêm calados e não incomodam, dos que dizem bom dia e não cheiram a cheiros, dos que se desculpam ao tocar-se. Cada um é a propriedade, e cada propriedade é mais sua que a bondade e a solidária certeza de amar.
Hoje quis ser outro e soube que a escolha é minha, e que o campo de batalha será sempre mais que um campo de mortos e de silêncios. Haverá sempre o milagre de um gemido, haverá sempre um joelho para poisar na terra. E todos os dias o espanto novo do sol que nasce outra vez.

2 comentários:

OceanoAzul.Sonhos disse...

Sábias palavras.

abraço
cvb

maria joão moreira disse...

Não sei como aqui cheguei... mas sei que gostei! voltarei, com certeza!