12.10.07

Escrever




Passo os olhos
pelos pormenores,
como se fossem do tamanho do mundo.
Enquadro em pequenas sílabas
as grandes coisas
que ocupam o espaço
que me ocupa.
Sinto a saliva a escorrer,
como um rio
em pleno verão
que se agonia em pranto
enquanto seca e parte.
Os lábios sussurram,
os olhos inclinam-se nas folhas
que me servem,
onde me estendo e gozo
no fluir das coisas
que me explodem nos dedos.
Desconserto o arranjo
das quadras certas,
das frases matemáticas
geométricas.
Sou as palavras despenteadas,
e a força bruta e intemperada
que rompe das angústias,
rotinas de fato e gravata.
Sou o teu amor repentino,
o livro amassado
das noites dormidas à cabeceira,
das palavras obscenas
que me atormentam,
que gozam na irreverência, com que a ternura
chega e cala,
no cansaço de quem se vence.
Sou a escrita
tornada dia,
nas palavras negras
em véu branco,
a prece inventada
por isso mais cara, mais certa
sou eu
nos dias que me faltam
antes que chegue a morte,
e me fique este esboço
que pode viver ainda
além de mim.

3 comentários:

PoesiaMGD disse...

Eu adoro as tuas "palavras despenteadas"!
Um abraço

Chellot disse...

"Sou as palavras despenteadas..."
Palavras soltas, livres e simplesmente suas, maravilhosas.

Beijos rabiscados.

Vera Carvalho disse...

Meu querido Jorge,
sinto toda essa força que explode na poesia mais bela, quando te leio!
Continua a soltar-te através dos dedos magistrais.
Com apreço, um abraço:).